19 junho 2007

frestas

Peregrino, o meu espírito deambula por sensações antigas – é que os demónios modernos também sentem e experimentam e trazem outros demónios dentro de si que necessitam exorcizar. Mais ainda quando eles têm eternidades de existência e eu uma memória infinita. Trago-os assim, empilhados como pratos sujos já com vestígios de bolor. A meio da noite, lá um ou outro dos inquebráveis se solta para fazer estrondo. E os meus olhos seguem o rastro dos estilhaços inexistentes pelo estuque branco das paredes. Houve uma temporada de noites menos encardidas que estas, que nem chuva nem lágrimas lavam. Noites cintilantes, de falas convincentes como promessas. Noites de vinho entornado sobre a mesa, saturnais romanos de ressurreição no solstício de Inverno, banquetes de prazeres misturados sem pudor ou prudência. Época de abundância selvática, de ausência de fome, de sangue puro e palpitante em matéria deliciosa. Hoje, com os avanços da tecnologia e o incremento da artificialidade, tenho uma fonte de auto-alimentação em curto-circuito e sofro de uma solidão crónica e de uma insatisfação sem medida ou fim. A noite chama-me, lá fora. Preciso sair... e caçar. Comer sem fome distrai-me.

photo: Vampiric Totem by For The Glory



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